*Por Paula Carvalho.
O universo de vídeo sob demanda (VOD) é fascinante, até porque temos empresas concorrentes abordando estratégias de entrega de direções opostas – com muitas agora se encontrando no meio e apostando em um futuro que empresta o melhor de cada modelo.
No fim deste ano, a ITV, a emissora comercial do Reino Unido, lança o ITVX, um divisor de águas e um momento decisivo em que veremos gêneros como drama roteirizado mudar para VOD-first.
Enquanto isso, temos plataformas SVOD – ou seja, cuja receita é originada de assinaturas – reavaliando algumas das suposições que alimentaram seu crescimento original – e agora vemos um papel claro para conteúdo linear em suas ofertas.
Dessa forma, ao invés de oferecer opções rígidas de visualização, as plataformas – sejam emissoras ou players nativos de VOD – estão reformulando as experiências de visualização ao fornecer conteúdo com base em diferentes estados de necessidade.
São modelos de negócios contrastantes e que mostram o quanto o mercado, para ganhar e reter audiências, vem polinizando ideias à medida que evolui.
Todos esses pontos de vista levam à conclusão de que a década de 2020 será caracterizada pela visualização combinada – com os vencedores da guerra entre plataformas implantando estratégias de janelas de distribuição que atingem o equilíbrio certo entre VOD e linear.
As emissoras estão adotando os aspectos da estratégia de VOD que melhor se adaptam ao seu posicionamento, preservando seus pontos de diferença, e as plataformas de VOD estão adotando conceitos estabelecidos há muito tempo, como TV com horários e descoberta de conteúdo com curadoria por meio de canais lineares.
Por exemplo, com a mudança de audiências ao vivo para conteúdo roteirizado, as emissoras começaram a mudar suas estratégias de janela para melhor corresponder aos comportamentos e preferências de visualização – e em muitos casos garantiram audiências maiores usando VOD pré e pós-transmissão do que linear.
Por outro lado, conteúdo de interesse compartilhado, como notícias, esportes e eventos especiais, ainda atrai a grande maioria de suas audiências do linear, especialmente quando as emissoras criam um verdadeiro senso de ocasião.
Enquanto isso, após anos de exclusividade VOD, a Netflix lançou o canal linear Netflix Direct na França; Prime Video e YouTube agora oferecem esportes ao vivo, e a Paramount+ lançou uma série de transmissões ao vivo dedicadas a gêneros ou franquias específicas como Star Trek.
Em um mundo de escolha de mídia ampla, parece que a curadoria de conteúdo está sendo reavaliada.
Além disso, também estamos vendo um afastamento das estratégias de lançamento de uma só vez e um leve distanciamento da compulsão de box-set. Demorou um pouco, mas as plataformas de VOD parecem ter percebido o quão útil é gerar buzz e aumentar o “efeito watercooler” agendando conteúdo regularmente, assim como as emissoras tradicionais.
Este é um movimento sábio; uma sensação de antecipação pode ter um enorme impacto nas respostas emocionais do público – em vez de alimentar hits de dopamina por meio de gratificação instantânea, as plataformas são capazes de explorar o que os psicólogos chamam de “recompensas trabalhadas ou esperadas”, que liberam serotonina de forma mais constante a longo prazo.
Essa abordagem mais restrita ajuda a maximizar o interesse pelo conteúdo por mais tempo e abre experiências mais significativas, memoráveis e duradouras.
Os lançamentos semanais de episódios também dão tempo para as discussões se desenvolverem em torno dos programas e potencialmente mantêm os assinantes a bordo por mais tempo, aumentando a receita de assinaturas.
Esta é uma tática que provavelmente terá um efeito indireto em outros tipos de conteúdo de visualização – e veremos a arte de trailers, provocações e cortes reavaliados.
Finalmente, à medida que a escolha do espectador se expande e as plataformas utilizam uma combinação mais ampla de estratégias de entrega de conteúdo – abrangendo VOD de formato longo e curto, ao vivo e sob demanda, IP e transmissão – será essencial que o mercado use soluções de medição que sejam anúncios e conteúdo neutros.
*Paula Carvalho é diretora da Kantar IBOPE Media.